Queria não estar dizendo isso pra vocês. A vida pós cirurgia continua bem fácil, e essa facilidade às vezes prega umas peças em quem é meio bocó, que nem eu.
Mas antes de falar sobre isso, deixa eu pedir uma coisa: Se você é minha mãe, minha irmã ou qualquer outra pessoa que me tem em alta estima, quase como se fosse um filho, faça a nós dois um favor e não leia os próximos parágrafos. A vida vai ser mais fácil assim, e eu estou muito bem, obrigado. Não passe nervoso à tôa. A Paula pode porque ela já sabe mesmo...
Pois é, enfim, o acontecido aconteceu na quinta feira última e foi uma das coisas mais desagradáveis de toda a minha vida. Sem mais delongas, vamos aos fatos:
Por alguma razão que eu não me lembro, eu acabei demorando bastante para almoçar neste dia em particular, e dado meu bom retrospecto nos últimos dias (desde a castanha de dois posts atrás), eu acabei, distraidamente e apressadamente, engolindo um pedaço maior do que devia. Sim, de novo, e para de me olhar com essa cara de reprovação. Eu não me orgulho disso.
Eu sei que esta não foi a primeira vez, mas porque então esta vez foi tão ruim? Porque era dum tamanho/formato tal que se ajustou com tanta precisão ao meu anel estomacal que não ia nem pra cima nem pra baixo por mais que eu tentasse. Sabe o que isso significa? Não? Acredite em mim, eu sei. E dessa vez eu não vou esquecer tão fácil não. Vamos lá:
Meu almoço foi às 13:30 e a entalação foi, portanto, por volta das 14:00. Isso aconteceu num restaurante, e o banheiro local foi alvo de minha primeira tentativa de alívio. Sim, para falar claramente, eu vomitei num banheiro público, o que é uma sensação inédita (e horrível) pra quem nunca tomou um porre digno de Homero, que aliás eu nem sei direito quem é ou porque bebia tanto.
(Segundo a Wikipedia, Homero foi o primeiro poeta grego, mas não fala nada sobre porres homéricos)
Senti um alívio, mas não a resolução do problema. Tanto que antes de deixar o local, precisei voltar ao mesmo banheiro para retomar a triste labuta. Acabei voltando rapidinho pra casa junto com a Carina e o Cezar, enquanto a Paula passava na ótica ajustar seus novos e lindos óculos escuros. A propósito, a cirurgia dela foi super bem, obrigado. Quando entrei pelo portão, corri para o banheiro sem dizer uma palavra. Quase não cheguei lá. Atenção para o detalhe, o restaurante onde eu estava fica a menos de 50 metros de casa. Porcaria!
Liguei no trabalho e avisei que estava impossibilitado de cumprir meus compromissos da tarde. Fiquei em casa assistindo The Wonders, um belo filme, mas que nunca me pareceu tão ruim. A cada 10 minutos eu levantava, ia ao banheiro e punha os bofes pra fora. Eca! E começou a doer.
Lição importante para vocês, crianças: tenham a certeza absoluta de que vocês têm o número do celular do seu médico. Ele pode fazer falta. Eu achava que eu tinha o tal do número, mas nunca conferi, e dessa vez que eu precisei, não tinha. Droga!
Liguei na clínica e a secretária me falou que se a situação não se resolvesse em algumas horas, seria necessário ir ao pronto-socorro para, possivelmente, fazer uma endoscopia para remover o bagulho. Aí foi o começo do calvário. Entrei em pânico aos poucos, já me vi sedado, sendo invadido bucalmente por câmeras e pinças e, aos poucos, conforme a dor se instalava, comecei a simpatizar com essa perspectiva.
Algumas horas depois, achei que era hora de buscar auxílio. No meu desespero, tomei uma das piores decisões da minha vida: fui ao pronto socorro mais próximo, um hospital que eu não vou citar o nome, mas que se você mora em Artur Nogueira, vai saber do que eu estou falando. E se não for daqui, não corre o risco de ir pra lá, então considere-se com sorte. Se bem que, desta vez, uma parte da culpa foi minha, e aqui caberia um pedido de desculpas, não fosse o histórico interesse em tratamentos ineficazes que os profissionais deste hospital demonstram. Afinal, pra eles, tudo se resolve com soro na veia e uma assinatura numa guia da Unimed, mas divago... O pior é saber que eu sabia disso e não decidi ir a outro lugar.
Ao chegar ao local, eu fui logo perguntando se eles tinham equipamento de endoscopia, afinal seria a solução que a minha clínica tinha indicado caso a situação se prolongasse. A médica que me atendeu argumentou que o tratamento correto seria aplicação de remédios via soro (que surpresa!) e insistiu que a minha instrução estava errada. Relutantemente eu aceitei, embora no coração eu não tenha aceitado, afinal eu estava nervoso e descontente com a alternativa oferecida, mas vambora. Fui porcamente examinado, tiraram apenas minha pressão e temperatura, a despeito de eu não ter sintomas de febre ou pressão alta ou baixa. Beleza, nada de errado, mas o problema era no estômago, lembra? Eu não só lembrava como não pensava em outra coisa. E tinha a nítida impressão de que nada daquilo iria resolver. Talvez um Plasil aliviasse os sintomas, mas não ia fazer a bagaça descer, droga! Mesmo não facilitando, aceitei.
Chega a enfermeira. Muito simpática, é verdade. Mas pela primeira vez na vida alguém conseguiu errar uma veia minha! E muitas vezes ela tentou puncionar a mesma veia na parte de cima da mão direita e não conseguiu. Droga de novo! Mudamos de braço e de lugar. Agora o alvo era uma veia no cotovelo esquerdo. E ela errou de novo! E tentou muitas vezes de novo! Damnit! Isso dói, pô!
Sem ver sucesso, me pareceu que Nosso Senhor estava querendo me dizer alguma coisa. E meu estômago também estava querendo me dizer outra coisa bem diferente. Fui correndo ao banheiro e vomitei de novo. Mas agora fiquei em real e inegável pânico. Saiu sangue junto. Tudo bem que foi algo em torno de meia gota de sangue, mas pô, eu estou com um corte recém feito por dentro, e eu não quero que ele abra! Foi a esta altura que a Paula, que estava comigo desde o começo, teve a melhor idéia da noite: Ouvindo a médica dizer que para fazer a endoscopia eu teria que recorrer ao hospital onde meu médico atendesse, ela decidiu ligar na Beneficiência Portuguesa, e foi à portaria do hospital para procurar o número de telefone!
Da minha perspectiva, era a salvação! Mas o hospital em questão não ia deixar alguém se recusar a tomar soro na veia e deixar barato, e eu devia ter previsto isso! Em menos de 5 minutos, a Paula voltou apressada da portaria, me dizendo que a gente ia embora. Senti alívio pela frase e preocupação pela voz/cara dela. "Porque?, conseguiu falar lá?, o que eles disseram?" perguntei eu, e ela só disse que no carro ela responderia. No caminho da rua, a médica até falou
en passant "melhoras, hein?", e eu senti uma ponta de simpatia pela criatura. Mal sabia que eu tinha acabado de ser convidado a me retirar do hospital pela médica. Tudo bem, eu realmente não estava colaborando, mas vamos combinar que todo o atendimento até ali não estava colaborando também! E vamos deixar claro também que estamos falando da mesma equipe médica que só enfaixou o braço machucado da mãe de um amigo meu sem sequer tirar radiografia, e depois ela (ela a mãe, não a médica) descobriu que o braço estava quebrado e precisou de atendimento de emergência e cirurgia também de emergência em Campinas. Quer respeito, seja competente ou, no mínimo, responsável.
Bom, seguindo a idéia da Paula, que a essa altura estava possessa comigo e com o hospital, justificadamente, afinal foi ela que passou pelo embaraço pelo meu 'mau comportamento', liguei para Benê (Beneficiência portuguesa, para os íntimos) e pedi o celular do Dr. Gustavo. A moça, de quem eu não lembro o nome, pegou meu telefone, entrou em contato com o dotô e em menos de 5 minutos ele estava me ligando. Ah, se a gente tivesse tido essa idéia antes...
O doutor me tranqüilizou, disse que o sangue era normal para quem vomitou desse tanto, e que se eu fosse pra Campinas agora pouco eu teria para fazer. Disse ainda que se a solução que ele me passaria por telefone não resolvesse, no dia seguinte ele me encaixaria numa endoscopia no primeiro horário, mas que era 90% de certeza que eu não teria que fazer nada disso. E me passou uma solução caseira que de tão simples parecia xamanismo. E só lembrando que a essa altura eram quase 9 da noite, ou seja 7 horas de sofrimento depois. E a perspectiva de uma noite similar àquela tarde me dava calafrios...
Ele me mandou tomar coca-cola em golinhos minúsculos até liberar o fluxo. Foi o que eu fiz, e em menos de 10 minutos parecia que alguém tinha dado descarga no meu estômago, eu senti tudo fluir de novo! Aliás, pensando bem, essa metáfora é bem legal, porque diz a lenda que Coca desentope privada mesmo, né?
[modo Garfield = ON]
E mais uma vez minha vida foi salva pelo milagre da Coca Cola.
[modo Garfield = OFF]
Agora, falando sério, se você, pós operado
safado (ou tonto e distraído como eu) resolver abusar já que a solução é simples, lembre-se que a coca cola é cheia de açúcar, e portanto engorda. E se você quisesse engordar de novo, pra que você teria feito a cirurgia, afinal de contas? E além disso, ela é cheia de um ácido que eu não lembro o nome, que rouba cálcio do seu organismo, e você já tem dificuldade de absorver cálcio, lembra? E além disso, ela tem gás, o que em tese ajuda a dilatar o seu estômago e perder todo o esforço que você fez até agora. E além disso tudo, ela pode causar dumping, e você não quer isso pra sua vida. Acho que já dei motivos suficientes pra você não querer abusar desta solução. E também, já falei demais, né?
A propósito, mãe, eu não tinha falado pra você não ler isso?
Beijos